Alana Yasmim dos Santos
Atualmente, o termo manifestação
está presente cotidianamente na nossa vida. Desde 2013, no Brasil, diversas manifestações ocorreram nas ruas das cidades brasileiras, em sua maioria por
motivações sócio-políticas. Manifestação
se difere de manifesto, aquela é uma
ação reivindicatória de um grupo de pessoas, ao passo que este é um texto de caráter persuasivo que visa declarar uma opinião, um pensamento, um ponto de
vista. Mas ambas possuem uma mesma raiz: manifestar é tornar visível e público;
manifestar é conquistar um espaço. Manifestar (intenções, desejos,
pontos de vista) é algo que o ser humano faz a bastante tempo, é só recordarmos
do Manifesto Comunista escrito em 1848 por Karl Marx e Friedrich Engels,
do Manifesto Anarquista escrito em 1850 por Anselme Bellegarrigue ou do
Manifesto Futurista, de 1909, escrito por Filippo Tommaso Marinetti.
No Brasil, o Manifesto
da poesia Pau-Brasil, escrito por Oswald de Andrade em 1924, é um reflexo
de como os escritores, poetas e artistas brasileiros estavam insatisfeitos com
as bases estéticas provenientes do povo europeu. Em oposição a poesia elitizada
e rebuscada, Oswald escreve que a “poesia existe nos fatos”, ou seja, nos fatos
vivenciados no dia a dia brasileiro. O cotidiano seria palco do fazer poético,
e a poesia iria se revelar inovadora, popular e natural. No início do
manifesto, Oswald traz o cenário-inspiração do Brasil: os casebres, as favelas,
a vegetação, o carnaval, as diversas etnias, o minério, as comidas e as danças.
“Pra me inspirar/ Abro a janela” escreveu Oswald de Andrade na poesia Balada da Esplanada. Ou seja, a poesia
estava logo a frente, nos acontecimentos diários, nos objetos comuns, nos
lugares conhecidos, nas pessoas ao redor: “Há poesia/ Na dor/ Na flor/ No
beija-flor/ No elevador”. O espaço-diário era espaço-poético.
Nos campos
infestados pelo conhecimento importado e da esmiuçada arte europeia – o
clássico, o alheio, o externo – em terra brasileira: precisaria persistir a
poesia brasileira sob olhar europeu? Eis, então, a proposta de um fazer poético
sobre o habitual, o cotidiano, o primitivo brasileiro. A poesia Pau-Brasil é,
primeiramente, provocativa. Provocar o pensamento estético dos artistas [e
estático no modus operandi europeu] do Brasil é o que queria Oswald
manifestar em março de 1924. Era preciso escrever o Brasil sob o olhar original
do começo do século XX, acompanhado do vocabulário e simplicidade do dia a dia.
“Ver com olhos livres” disse Oswald como crítica à fórmula, aos métodos, às
amarras estéticas. A poesia antiacademicista de Oswald de Andrade valorizaria a
oralidade, os versos livres, as palavras do cotidiano e o abandono das
pontuações. Ler uma poesia modernista é redescobrir a língua portuguesa. Oswald compara a poesia Pau-Brasil a
uma criança, pela sua agilidade e candura, pela sua vivacidade. O poeta
modernista, também, como uma criança, iria manusear as palavras sem medo, sem
limitações, com a liberdade própria do ato criativo, com a curiosidade nata da
infância. Entretanto, a poesia Pau-Brasil não era menos elaborada ou inferior
aos engessados e rebuscados versos da poesia parnasiana, por exemplo, como
muitos podem pensar pela simplicidade poética. A busca da poesia em palavras
não-poéticas era uma forma de mostrar que era possível encontrar poesia em
qualquer lugar, demonstrando que a linha que separava a poesia do cotidiano não
era tão profunda assim.
Poema-experimento,
poema-cotidiano, poema-primitivo, poema-ironia, poema-surpresa: poesiaS. O
plural é o que caracteriza o Brasil: retratoS do Brasil feitos com câmeras fotográficas produzidas no Brasil, revelados no Brasil, expostos no Brasil e
exportados para o mundo. "Exporta-te, Brasil!" É o que Oswald manifestava. A
poesia Pau-Brasil deveria ser exportada, assim como a madeira advinda do
Pau-Brasil foi. Poesia-exportação.
[Morro da Favela - 1924 | Tarsila do Amaral]
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